segunda-feira, 12 de novembro de 2018

A PESQUISA DA MEMÓRIA SOCIAL A PARTIR DOS ACERVOS CULTURAIS DA COLÔNIA FRANCESA

Em 12/11/2008, participei como comunicador no X ENPOS (Encontro de Pós-Graduação) e XVII Congresso de Iniciação Científica, da Universidade Federal de Pelotas. 


A PESQUISA DA MEMÓRIA SOCIAL A PARTIR DOS ACERVOS CULTURAIS DA COLÔNIA FRANCESA DE SANTO ANTÔNIO EM PELOTAS-RS

Autores: BETEMPS, Leandro Ramos1; CERQUEIRA, Fábio Vergara2

1,2 Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural – ICH/UFPel. 

 


1.  INTRODUÇÃO

 

O presente texto pretende comunicar a construção metodológica realizada para desenvolver este projeto de pesquisa, sob a orientação do Prof. Dr. Fábio Vergara Cerqueira, e vinculado ao Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural, do Instituto de Ciências Humanas, da Universidade Federal de Pelotas. Aqui apresento as diretrizes do projeto, depois a construção do corpo teórico e metodológico. E, por fim, alguns resultados obtidos até o momento.

Em 2000, concluí uma pesquisa sobre os traços culturais do grupo étnico da Colônia Francesa de Santo Antônio. Esta colônia foi fundada em 1880 e está localizada no Distrito de Quilombo (Sétimo Distrito de Pelotas), a distância de 35 km da cidade. Em sua trajetória histórica o grupo sempre buscou estratégias de sobrevivência econômica e reprodução cultural. Sua economia se constituía da fabricação de vinho, de frutos cristalizados, compotas e doces em pasta.

À época da pesquisa de campo, percebi a quantidade de elementos, carregados de memórias e simbolismos, que ajudam as famílias a fortalecerem os laços étnicos, mantendo o grupo unido há 128 anos.

Problematizando, me perguntei se a partir destes fragmentos de memória seria possível compreender: o espaço, as relações, as permanências e as identidades. Com esta problematização, demos início às definições e metas do projeto.

Como tema, escolhemos a gestão do acervo cultural do grupo étnico, tendo como objeto de pesquisa a própria relação entre memória social e os suportes de memória da comunidade formada pelo grupo, durante sua trajetória histórica.

Os problemas são saber quais os suportes de memória a que o grupo se remete e como esse acervo de suportes mantém a memória social do grupo, conta sua história e constrói a identidade étnica no tempo.

Como objetivo geral, buscamos identificar e analisar elementos que evocam e/ou representam a memória social que perpassa a História da comunidade. E, como objetivos específicos, investigar e identificar os elementos indicados pelo grupo como suportes da memória social. A estes objetivos, somam-se a catalogação e inventário dos suportes orais, visuais e materiais, que contam a história e a memória social, contextualizados com o suporte escrito, assim como a análise e contexto do inventário constituído, para revelar aspectos que evocam a memória, a história ou a etnicidade do grupo.

Acervo de suportes de memória social, História cultural e identidade étnica francesa são as palavras-chave que indicam o título do trabalho: “Suportes de Memória Social, História e Etnia: os acervos culturais da Colônia Francesa de Pelotas-Rs”.

 

2.  METODOLOGIA

 

O primeiro passo foi buscar informações e discussões possíveis referentes ao tema. Uma revisão bibliográfica foi essencial. Com isso busquei obras sobre imigração, colonização e História, tanto de Pelotas, como do Rio Grande do Sul, Brasil ou mesmo da França. Pela minha formação acadêmica, priorizo a historicidade como base de análise dos suportes, por entender que ela é quem dá significados e contextos aos suportes, aproximando os indivíduos, criando a noção de etnicidade e construindo a identidade. Com esta linha teórica, busquei leituras que me apoiassem e pudessem dialogar juntas. Para isso precisei recorrer a obras sobre memória, história, etnia e temas transversais que aproximam estas categorias.

A revisão bibliográfica me deu, por exemplo, pressupostos teóricos para definir o grupo étnico, dito “francês”, como sendo o grupo de 50 famílias francesas fundadoras e seus descendentes. Propiciou, ainda, entender que os suportes de memória são como pontes que ligam indivíduos separados por espaços, tempos, culturas ou grupos sociais diferentes.

Depois definimos o desenrolar metodológico. A pesquisa, quanto a seu objetivo, é um estudo histórico, descritivo, explicativo. Quanto ao procedimento, é uma pesquisa bibliográfica, documental, com levantamento de dados e trabalho de campo. As etapas metodológicas da pesquisa são: a coleta de dados, a leitura interpretativa destes dados, a catalogação e criação de um catálogo descritivo de suportes, a categorização e tematização dos suportes, depois a comparação das categorias e a análise de como o grupo étnico francês gerencia seus suportes de memória, com vistas à história e à identidade étnica.

Os suportes de memória são elementos de cultura material, visual ou oral. Eles formam um conjunto denominado acervo cultural étnico-familiar e está sob a guarda de um arquivo familiar. Este arquivo tem a função de conservação de um passado e de uma identidade através da memória. Então, ele é formado por diferentes acervos culturais que servem para se avaliar o grau de compartilhamento e uso da memória social do grupo. São eles os acervos: iconográfico, material e oral. Para fazer uso destes acervos foi necessária uma revisão teórica específica para cada suporte.

Para o acervo iconográfico, buscamos fundamentação nos pressupostos dos teóricos da cultura visual. Pois, para analisar uma fotografia, é preciso usar operadores que revelem a visualidade, que articula a imagem, o objeto, o modo de olhar e a cultura visual dos sujeitos.

Para o acervo material, foi preciso analisar a diversidade material do cotidiano, contextualizando-a com suas variações de representação e de imaginário, com base nos teóricos de cultura material, sobretudo da Arqueologia Histórica.

Para o acervo oral, formado de depoimentos que, como narrativa, carregam a experiência pessoal e a articulação simbólica, foi necessário buscar auxílio nas teóricas de História oral.

Com o intuito de me aproximar do grupo étnico, criamos um roteiro de entrevista, semi-estruturada, com algumas perguntas fechadas em forma de questionário e outras abertas para o depoente falar mais livremente. Com as entrevistas e a observação visual, é possível acessar os diferentes suportes. O roteiro de entrevista é uma síntese do problema da pesquisa e busca as características do entrevistado, sua relação com a Colônia Francesa e a memória através da indicação de suportes.

 

3.         RESULTADOS E DISCUSSÃO

 

A memória social surge quando os acervos testemunham o passado e alimentam as identidades no presente. Estas duas perspectivas dependem somente do indivíduo. Ele é quem vive, necessita e lembra. Ele escolhe e se apropria de determinados suportes para contar a sua história.

Visto existir essa subjetividade que diversifica e enriquece o questionamento científico, são investigadas três famílias com diferentes graus de proximidade com o núcleo da Colônia Francesa: uma que sempre viveu na Colônia; outra que saiu da Colônia, mas habita em Pelotas; e outra que saiu do Município. Em cada uma das três famílias, são investigadas diferentes gerações: alguém da 1ª geração (por exemplo, um avô); outro da 2ª geração (um filho ou sobrinho); e outro de 3ª geração (um neto ou sobrinho-neto).

Cada indivíduo está inserido em grupos sociais diferentes e utiliza elementos diferentes para contar sua história pessoal ou familiar e manter suas raízes. Assim, o depoente apresenta diferentes suportes da memória pessoal para serem inventariados: suportes de fonte material (por exemplo, construções, objetos, registros escritos); suportes de fonte visual (fotografia, pintura, desenhos) e suportes de fonte oral (conselhos, vivências, saberes, anedotas).

Para sua continuidade na fronteira étnica, o grupo fez uso de alguns traços culturais que, representando símbolos e significados, vinculam indivíduos entre si em uma organização social chamada etnia. A existência de um grupo étnico não vem da presença de traços culturais; vem, outrossim, das relações e dos sentimentos de pertença na fronteira étnica. É por isso que não buscamos resgatar memória ou identidade. Não existem mais franceses, existem sim, descendentes de famílias francesas que fazem uso de determinados suportes de memória para marcar suas relações de memória e identidades que variam no tempo, conforme as necessidades históricas.

Para responder ao nosso problema de pesquisa, é preciso cruzar as diferentes fontes (orais, materiais e visuais) e as diversas categorias de análise surgidas nas entrevistas. É preciso fazer dialogar a memória social com seus suportes.

 

4. CONCLUSÕES

 

Para finalizar, eu gostaria de chamar atenção para os seguintes aspectos que penso serem importantes nas pesquisas sociais.

Primeiro, pensar nos riscos e dificuldades que o projeto de pesquisa pode ter. Neste caso, o mais significativo deles é a descaracterização do meio. Essa descaracterização não se dá por falta de interesse ou mudança cultural. É natural haver ressignificações e alterações de conteúdo ao longo do tempo, pois o homem é um ser em constante atualização. Mas a descaracterização se dá por empobrecimento da zona rural e leva à mudança acelerada das referências às próprias raízes, assim como às antigas adegas, fábricas e casas de pedra erguidas pelos imigrantes.

Por fim, e não menos importante, estamos ligados ao grupo das Ciências Humanas ou Sociais, e isso intensifica o dever e a responsabilidade de nossas pesquisas estarem relacionadas a algum impacto social. É importante pensarmos nos resultados esperados. A que e a quem servirão nosso trabalho? Ele poderá tornar melhor a vida da comunidade e, sobretudo, de nossos depoentes?

Por isso, é interessante que nosso trabalho possa se vincular com projetos já existentes, cujos temas sejam interligados ao de nossa pesquisa. A partir de uma demanda da comunidade étnica estudada, surgiu o interesse num projeto de musealização. Sem conseguir realizá-lo sozinha, a comunidade recebeu essencial apoio do Poder Público e da Academia, e juntos puseram o projeto em andamento. Minha intenção é de que o trabalho de pesquisa histórica e inventário possam ser utilizados na organização e gestão deste museu.

 

5.  REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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BERGER, P. e LUCKMANN, T.. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. Trad.de Floriano de Souza Fernandes. 23ª ed. Petrópolis: Vozes, 2003 (1985). 248p.

BETEMPS, Leandro R. Vinhos e Doces ao Som da Marselhesa: um estudo sobre os 120 anos de Tradição Francesa na Colônia Santo Antônio em Pelotas-RS. Pelotas: UCPel, 2003. Volume 6. Coleção História e Etnias de Pelotas.

BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: Lembrança de velhos. 13ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. 484p.

BURKE, Peter. O que é história cultural? Trad.de Sérgio Góes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005, 191p.

CANDAU, Joel. Antropologia de la memória. Buenos Aires: Nueva Vision, 2002. 120p.

CERQUEIRA, Fábio V.; OLIVEIRA, Maria Augusta M. A Imagem como testemunho da história: a memória do Conservatório de Música na coleção de fotografias em preto-e-branco (1918-1969). In: NOGUEIRA, Isabel (org.). História Iconográfica do Conservatório de Música da UFPel. Porto Alegre: Palotti, 2005.

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FUNARI, Pedro Paulo. Arqueologia, História e Arqueologia Histórica no contexto sul-americano. In: FUNARI, Pedro Paulo (org.). Cultura Material e Arqueologia Histórica. Coleção Ideias. Campinas, SP: Unicamp, 1998, p.8-34.

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. Trad. Beatriz Sidou. São Paulo: Centauro, 2006.

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PESAVENTO, Sandra. História & História Cultural. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. 132p.

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SCHELLENBERG, Theodore. Arquivos modernos: princípios e técnicas. 3ª ed. Rio de Janeiro: FGV, 2004.


domingo, 3 de junho de 2018

Apresentação: Criando ferramentas para pensar a Memória Social através dos acervos culturais da Colônia Francesa de Pelotas/RS

Fonte: BETEMPS, Leandro Ramos. Criando ferramentas para pensar a Memória Social através dos acervos culturais da Colônia Francesa de Pelotas/RS. In: Anais do Seminário de Metodologia da Pesquisa em Arte. UFPel, 2008.

Aqui os slides da apresentação feita em 03/06/2008: